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Autor: Felipe Gustavo Westphal

Colaboradores: Grégori C. Tondello e Roger S. Bussmann



Definição

Sepse é uma doença sistêmica causada por uma reação desproporcional do organismo contra a presença de microorganismos patogênicos em locais estéreis do corpo. A sepse ocorre quando há infecção associada a pelo menos dois sinais de resposta inflamatória sistêmica (SIRS). Sepse grave quando há comprometimento funcional de um ou mais órgãos ou sistemas. Choque séptico é definido pela hipotensão refratária à infusão de líquidos.



Epidemiologia

A sepse é a causa mais comum de óbito em unidades de terapia intensiva, excetuando as unidades coronarianas.

No Brasil, a taxa de mortalidade é de aproximadamente 60%, sendo que a média mundial beira os 40%. Os novos casos anuais no país chegam a 400000 e os gastos com a doença beiram os US$8,5 bilhões.

O número de mortes supera os de câncer de mama e de intestino, infarto agudo do miocárdio e da AIDS.

Negros possuem maior incidência e pior evolução, provavelmente devido à fatores genéticos ligados ao polimorfismo das citocinas TNF, IL-1 e IL-10.

A freqüência do choque séptico está aumentando devido às cirurgias cada vez mais agressivas, aos microorganismos multirresistentes e ao imunocompromentimento resultante de doenças e drogas imunossupressoras.


Fig1 FelipeW Sepse

Fonte: TELES et al. SHOCK, Vol. 30, No. 7, pp. 00Y00, 2008












Fisiopatolgia

De início, a sepse desencadeia inflamação. Bactérias gram-positivas e gram-negativas se ligam respectivamente a receptores toll-like 2 (TLR-2) e TLR-4. Essas ligações desencadeiam uma cascata liberando citocinas (TNF-α e IL-6) e, assim, culminando no aumento da expressão das moléculas de adesão dos neutrófilos e células endoteliais, e a ativação dos neutrófilos, o que leva a uma reação bactericida. Contudo, neutrófilos, monócitos, plaquetas e as citocinas lesam as células endoteliais.

O sistema de coagulação também é ativado, convertendo fibrinogênio em fibrina, que por sua vez é ligada às plaquetas, o que leva a trombos microvasculares. Esses trombos , devido à obstrução do fluxo sanguíneo, causam hipoxia tecidual e liberação de mediadores, causando mais dano às células endoteliais. Além disso, no choque séptico as concentrações de fatores que amortecem a coagulação (proteína C, proteína S, antitrombina e inibidor da via do fator tecidual) são diminuídos.

A hipóxia tecidual desencadeia resposta inflamatória, principalmente através da ativação de citocinas e óxido nítrico. Também há ativação da cascata de coagulação, assim como a liberação de neutrófilos, monócitos e plaquetas. A hipóxia também ativa o fator indutor de hipoxia-1α (FIH-1α), que eleva a produção de eritropoetina, com função protetora para o cérebro e outros tecidos, e fator de crescimento edotelial vascular (FCEV). O FCEV possui papel na inibição da fibrinólise (destruição de coágulos) e no aumento da produção de óxido nítrico. Este por sua vez, possui um efeito lesivo adicional, que é a inibição das ações benéficas do FIH-1α durante a hipoxia.

Depois de cerca de uma semana, ocorre imunossupressão. Isso acontece porque a sepse muda o fenótipo de células TH1 (pró-inflamatório) para TH2 (anti-inflamatório). A disfunção de múltiplos órgãos podem também ter papel anti-inflamatório devido à apoptose de células imunes, endoteliais e epiteliais.

Os distúrbios cardiovasculares são características de todo tipo de choque, entre eles: pressão de pulso aumentada, resistência vascular sistêmica reduzida e hipovolemia funcional. Na sepse, primeiramente ocorre vasodilatação acentuada, principalmente nos tecidos infectados. A coagulação intravascular disseminada consiste no desenvolvimento de microcoágulos em várias áreas do corpo, podendo resultar em coagulação intravascular disseminada (CIVD) e causar hemorragia. Além disso, hemácias se aglutinam causando estagnação do sangue. O débito cardíaco se encontra elevado em talvez metade dos pacientes, devido à alta taxa metabólica e vasodilatação em vários pontos do corpo.

Fig2 FelipeW Sepse

Fonte: http://crashingpatient.com/wpcontent/images/part3/mech%20of%20sepsis%201.jpg












Diagnóstico

Sepse grave resulta da sepse em adição ao comprometimento de um ou mais órgãos ou sistemas como: cardiovascular (hipotensão arterial). respiratória (lesão pulmonar levando à hipoxemia), renal (oligúria e/ou creatinina elevada), hepática (hiperbilirrubidemia direta), hematológica (plaquetopenia) e sistema nervoso central (encefalopatia – alteração do estado mental).

Quando há sepse associada à hipotensão (pressão arterial sistólica (PAS) < 90 mmHg ou pressão arterial médica (PAM) < 65 mmHg ou diminuição de > 40 mmHg da PAS básica) que não responde à reposição de líquidos o diagnóstico é de choque séptico.

Para o diagnóstico, deve haver infecção associada a pelo menos dois sinais de SIRS, sendo estes:

  • febre (> 38ºC) ou hipotermia (< 36ºC).
  • taquicardia (> 90 bpm), taquipnéia (> 20 rpm), hipocapnia PCO2 (< 32 mmHg) ou necessidade de respiração ventilatória mecânica.
  • leucocitose (> 12000 células/mm3), leucopenia (< 4000 células/mm3) ou um desvio à esquerda (> 10% células em bastão – imaturas).
  • edema após reposição volêmica
  • hiperglicemia
  • alteração do estado mental
  • níveis séricos elevados de procalcitonina e de proteína C reativa.


A avaliação clínica inicial deve focar-se na via respiratória, devido à necessidade de intubação, na respiração, circulação e então deve ser feito o início da ressuscitação. A SRIS pode ser confirmada pela verificação de leucócitos e dos sinais vitais. Testes de gasometria e lactato arterial também são imprescindíveis. A análise para detectar o local da fonte de infecção também deve ser feita. Estes testes incluem lâminas com coloração para Gram e culturas apropriadas (escarro, sangue, urina, líquidos), além de testes físicos. TC e ultrassonografia são indicados no caso de suspeita de sepse abdominal. Radiografia de tórax ajudará no diagnóstico de pneumonia, empiema e lesão pulmonar aguda. Um cateter venoso poderá auxiliar na avaliação hemodinâmica do paciente. Para verificar a função dos órgãos, testes de função renal, hepática de da coagulação devem ser feitos. Após a identificação do foco da sepse, é crucial atacá-lo direta e imediatamente.



Prevenção

Medidas de prevenção da sepse incluem lavagem das mãos, elevação de cabeceira do leito, técnicas rigidamente estéreis para inserção de cateteres e até mesmo o uso destes impregnados por antibióticos. Isolamento de pacientes portadores de organismos resistentes e/ou imunocomprometidos, além do uso racional de antibióticos também podem prevenir a infecção.



Tratamento

Para intervenção inicial, é de uso padrão o pacote de ressuscitação das 6 horas iniciais. O termo “pacote” está relacionado a um conjunto de intervenções relacionadas a uma única doença, tendo estas a melhor evidência científica disponível. Estudos mostram que esse protocolo de tratamento está associado com significativa redução da mortalidade. Este pacote inclui:

  • Medida do lactato sérico.
  • Coleta de pelo menos duas amostras de hemoculturas, de sítios diferentes.
  • Iniciar antibioticoterapia adequada na primeira hora após diagnóstico.
  • Se houver hipotensão ou lactato maior ou igual a 4mmol/l, administrar 20 a 30 ml/kg de cristalóides.
  • Iniciar vasopressor se não for atingida PAM de 65 mmHg ou mais após infusão de cristalóide.
  • Atingir uma PVC maior que 8 mmHg nos pacientes que necessitem desta infusão de cristalóide.
  • Atingir uma saturação venosa central superior a 70%.



Fig3 FelipeW Sepse

Fonte: Kumar et al, CCM 34:1589, 2006














Prognóstico

O prognóstico da sepse está relacionado com o estágio e a gravidade da doença. Fatores como idade e estado nutricional também podem influenciar.

A terapia precoce, o tratamento ágil e o controle infeccioso por antibióticos além da ressuscitação hemodinâmica nas primeiras horas após o diagnóstico possuem grande impacto no prognóstico. A intervenção precoce aumenta a probabilidade de interromper o efeito “cascata” da sepse, impedindo disfunções orgânicas como insuficiência renal e hipotensão não responsiva a volume. O atraso entre os primeiros sinais de sepse e o seu tratamento de fato é um dos grandes responsáveis pela alta taxa de mortalidade.



Referências bibliográficas

WESTPHAL G.A., FEIJÓ J., ANDRADE P.S., TRINDADE L., SUCHARD C., MONTEIRO M.A.G. et al.' Estratégia de detecção precoce e redução de mortalidade na sepse grave'. RBTI, São Paulo, 2009.

GOLDMAN L., AUSIELLO D. Cecil Medicina 23ª ed, pgs 873-883, cap 109 Rio de Janeiro, Elsevier 2009.

SILVA E. Sepse – Manual 2ª Ed, São Paulo, Atheneu 2006.

GUYTON A.C., HALL J.E. Tratado de Fisiologia Médica 11ª ed, pg 286, cap 24, Rio de Janeiro, 2006.


Links relacionados

Instituto Latino Americano da Sepse. Disponível em: http://www.sepsisnet.org/Pages/Home.aspx

Surviving Sepsis Campaign. Disponível em: http://www.survivingsepsis.org/Pages/default.aspx

Information and Resources: Sepsis and Sepsis Shock. Disponível em: http://www.webmd.com/a-to-z-guides/sepsis-septicemia-blood-infection

Revista Brasileira de Terapia Intensiva. Disponível em: http://rbti.org.br/

International Sepsis Fórum. Disponível em: http://www.sepsisforum.org/

Critérios Para o Diagnóstico de Sepse. Disponível em: http://www.portalsaudebrasil.com/artigosuti/resp407.pdf







--Felipe Westphal 16h50min de 1 de dezembro de 2011 (UTC)

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