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Autor: João Guilherme Mattei Pioli

Colaboradores: Edson Ananias Jr e Marina Zavadinack e Silva

Introdução

AINES1

Fonte: http://blogs.jovempan.uol.com.br/medicodefamilia/os-riscos-da-automedicacao/

Nos últimos 200 anos a indústria farmacêutica sofreu intensas modificações tanto em método quanto em quantidade de produção, que lhe transformou em uma das maiores indústrias mundiais. A partir daí a produção, a disponibilidade e a criação de medicamentostornaram-se cada vez maiores. Isso deu origem a um acontecimento bastante discutido entre os especialistas da área da saúde, a automedição.

O uso de medicamentos sem orientação de profissionais é um importante método de desafogamento dos sistemas de saúde pública, principalmente nos países em desenvolvimento como o Brasil. A discussão sobre isso dar-se em torno de quais medicamentos podem ser liberados ou não para o uso sem orientação.

No Brasil os antiinflamatórios não esteroides (AINES) ocupam três das cinco primeiras posições de medicamentos mais utilizados sem orientação médica. O problema disso é que essa classe de medicamentos interfere em muitos mecanismos fisiológicos normais do homem e o uso deles pode causar graves complicações.

Um dos motivos dos AINES serem os mais procurados pela população em geral é que eles atuam, além de antiinflamatórios, como antitérmicos e analgésicos. Os processos normais e onde agem os AINES serão explicados na sequência.

Mecanismos fisiológicos normais e onde agem os AINES

Processo inflamatório

O processo inflamatório é uma resposta do sistema imunológico do organismo a estímulos que podem ser externos, como uma lesão tecidual ou contaminação por agente infeccioso, até estímulos internos como, por exemplo, nas doenças autoimunes. Após o estimulo inicial ocorre uma sequência de eventos que originam manifestações locais ou sistêmicas características.

A inflamação inicia-se com a liberação de substancias que são produzidas por células do sistema imunológico que são mediadoras, ou seja, controlam a intensidade da resposta inflamatória e induzem a produção de substancias que vão agir diretamente nas células ou órgão alvo para induzir mecanismos que auxiliam o combate ao agente causador do estimulo inicial. Uma das principais substancias é a prostaglandina. Ela é responsável indiretamente pelo inchaço, dor e febre que são as principais queixas de pacientes com infecções leves.

Formação das prostaglandinas

As prostaglandias fazem parte de um grupo de compostos originados do metabolismo dos ácidos graxos. Após uma sequência de reações químicas os ácidos graxos são transformados em ácido araquidônico que, por sua vez, sofre ação de duas classes de enzimas, as lipooxigenases, que dão origem aos leucotrienos (não serão abordados nesse texto) e as ciclooxigenases (COX) que dão origem as prostaglandinas e aos tromboxanos.

Há, comprovadamente, duas COX produzidas pelo organismo humano a COX-1 e a COX-2. A primeira está presente constitutivamente na maioria dos tecidos e órgãos já a segunda é induzida durante os processos inflamatórios.

Ações das prostaglandinas e tromboxanos

As prostasglandinas atuam no hipotálamo, que é o centro responsável pela regulação térmica, desencadeando um aumento da temperatura. Essa alteração na temperatura é importante porque as enzimas que vão atuar diretamente na destruição do corpo estranho funcionam melhor em temperaturas mais elevadas do que o normal. Elas agem nos vasos causando vasodilatação para que as proteínas que estão na corrente sanguínea possam passar para o tecido, o que não acontece naturalmente, resultando em inchaço local. As prostaglandinas também atuam na medula espinhal, causando aumento na sensibilidade da dor (hiperalgesia).

Além disso, há uma numerosa gama de ações conhecidas que são realizadas pelas prostaglandinas em condições fisiológicas normais. Elas atuam em vários tecidos e são produzidas constitutivamente pela COX-1. No tecido uterino, durante a menstruação, há uma liberação de prostaglandinas que causam contração da musculatura lisa que junto com a hiperalgesia podem originar cólicas menstruais. Já durante a gravidez essa contração promovida por prostaglandinas pode induzir o parto. Outro efeito delas é o relaxamento da musculatura lisa vascular e pulmonar, na primeira resultando em vasodilatação e na segunda em dilatação dos brônquios.

Dentre as varias ações fisiológicos normais destacam-se, por serem alvo dos estudos sobre os AINES, a atuação das prostaglandinas no estômago onde elas ajudam na formação do muco, que protege a parede estomacal contra o ácido gástrico, e nas plaquetas, que junto com os tromboxanos promovem a agregação plaquetária, importante etapa da coagulação sanguínea.

Efeitos terapêuticos AINES

Os anti-inflamatórios não esteroides são compostos por medicamentos de diferentes classes químicas que atuam por mecanismos distintos produzindo o mesmo efeito, que é a inibição das enzimas COX-1 e 2 e consequentemente a síntese de prostaglandinas.

Os efeitos terapêuticos desejados advêm da inibição da enzima COX-2 que é induzida nas células imunológicas quando há processo inflamatório presente. Isso resulta no bloqueio das ações da prostaglandina durante a inflamação diminuindo a dor, o inchaço e a temperatura corporal.

Além disso, o ácido acetilsalicílico é utilizado na prevenção de acidentes vasculares causados por trombos porque ele inibe permanentemente a produção de prostaglandinas pelas células plaquetárias sanguíneas e com isso dificultam a coagulação e formação de trombos.

Efeitos colaterais dos AINES

Os efeitos terapêuticos são oriundos da inativação da COX-2, porém a maioria dos AINES age concomitantemente na COX-1 e isso traz consequências maléficas ao organismo.

Ulcera Gastrica

Úlcera Gastrica. Fonte: http://oiprazeremmeconhecer.blogspot.com.br/2012/05/gastrite-e-o-mesmo-que-ulcera-gastrica.html

No estômago, a inibição da COX-1 faz com que a produção de muco protetor seja diminuída e com isso o ácido gástrico pode causar irritação e até lesões ulcerosas no estômago. Somado a isso a ingestão oral do medicamento faz com que a irritação da parede estomacal seja maior.

A capacidade de impedir a agregação plaquetária é outro problema que, quando não utilizado como função terapêutica, é uma complicada situação porque aumenta o tempo de sangramento podendo causar graves hemorragias, principalmente se houver lesões ulcerosas no estômago.

O AINES mais utilizado no Brasil é a dipirona sódica. A comercialização dessa substancia esta proibida em alguns países da Europa e nos Estados Unidos da América porque há estudos que indicam que ela pode causar agranulocitose, ou seja, a falta de produção de células granulares que são responsáveis pela defesa do organismo.

Automedicação no Brasil

Tabela AINES1

Ranking dos medicamentos mais usados. Fonte: http://www.scielosp.org/pdf/rsp/v31n4/2212.pdf

A automedicação é um ato corriqueiro e crescente no Brasil e no mundo. Ela é importante, pois diminui a procura por atendimento médico e consequentemente evita a sobrecarga dos sistemas de saúde. Porem, quando realizada de forma incorreta ela pode causar prejuízos graves principalmente quando se trata de AINES, que, no Brasil, é a classe de medicamentos mais utilizada sem orientação médica.

Estudos realizados no país mostraram o ranking não só de medicamentos mais utilizados como também os motivos de procura por estes. Os AINES ocupam três das cinco primeiras posições neste ranking e, somados, os efeitos mais procurados pelos pacientes são os de antitérmico e analgésico seguidos da capacidade anti-inflamatória.

Tabela AINES2

Motivos da procura por farmacos para automedição. Fonte: http://www.scielosp.org/pdf/rsp/v31n4/2212.pdf

A substancia que lidera esse rankiamento é a dipirona sódica que, como dito anteriormente pode causar complicações graves e é proibida em alguns países.


Conclusão

Por ser a classe de medicamentos mais procurada e utilizada na prática da automedicação, vê-se que o uso dos AINES é, na maioria das vezes, feito de forma inadequada, sendo usado frequentemente na busca de uma resposta antitérmica e analgésica, fugindo da principal finalidade dos medicamentos dessa classe, que é o efeito anti-inflamatório.

Conhecendo-se os efeitos colaterais da ingestão inadequada de AINES, indica-se que sejam utilizadas outras classes de medicamentos que tem primariamente efeito antitérmico e analgésico, caracterizando uma resposta mais rápida e menos danosa do que o uso de AINES traria.

Referências:

• ARRAIS, Paulo Sérgio D., Perfil da automedicação no Brasil. Rev. Saúde Pública, 31(1): 71-7, 1997 disponível em: http://www.scielosp.org/pdf/rsp/v31n4/2212.pdf
• GOODMAN & GILMAN – As bases Farmacológicas da Terapêutica, Editora MAC GRAW HILL – 11a Edição – 2006.
• GUEDES DE BRITO, Éverton; Automedicação Dos Profissionais De Saúde. Disponível em: http://www.cpqam.fiocruz.br/bibpdf/2010brito-eg.pdf
• GUYTON, Arthur C.; HALL, John E. Tratado de Fisiologia Médica. 11 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2006.
• LEVY, Roger A., O Uso de Drogas Anti-Reumáticas na Gravidez. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/%0D/rbr/v45n3/v45n3a07.pdf
• KUMMER, Carmen L.; COELHO, Tereza Cristina R. B.; Anti-inflamatórios Não Esteroides Inibidores da Ciclooxigenase-2 (COX-2): Aspectos Atuais. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rba/v52n4/v52n4a14.pdf
• MONTEIRO, Elaine Cristina A.; TRINDADE, Juliana Maria de Freitas; DUARTE, Ângela Luzia Branco P.; CHAHADE, Wiliam Habib, Os anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs). Disponível em: http://www.moreirajr.com.br/revistas.asp?fase=r003&id_materia=3744
• ZATERKA, Schlioma, Lesões induzidas por AINEs no sistema digestório. Disponível em: http://www.moreirajr.com.br/revistas.asp?id_materia=264&fase=imprime

Links relacionados

Guia de automedicação da OMS (Inglês) - http://apps.who.int/medicinedocs/en/d/Js2218e/

Leitura complementar, Revista de saúde publica - http://www.scielosp.org/pdf/rsp/v31n4/2212.pdf

Editorial sobre automedicação - http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-42302001000400001

Vídeos Ilustrativos

Vídeo aula sobre o provesso inflamatório - http://www.youtube.com/watch?v=LrY-BnBOvRw

Prostaglandinas - http://www.youtube.com/watch?v=2tGaAqJvspw

Endoscopia digestiva alta de um paciente com ulcera péptica - http://www.youtube.com/watch?v=bHJ9uwLuuQ0

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